14 de agosto de 2015

IX - Luminosidade



"Uma luz que não produz sombra..."

Toda luz precisa servir para algo: ser clarão em profunda escuridão, ser guia em caminho opaco, sinalizar um ponto almejado, tornar visível um ponto que não se vê, apontar para algo... Existe uma centelha divina dentro de cada coração e, por isso, podemos todos ser luz. Mas, é claro, nem todos sabem o que significa e muito menos como é ser luz.

Brilho bom é aquele que suavemente lhe aponta o caminho ou o objeto que se quer ver. Se a luz está muito forte, há saturação – um fotógrafo sabe bem a importância da luz: não pode ser demais nem de menos. Brilho suave ilumina de verdade. Brilho excessivo cega. Moderação sempre.

Brilho bom também é aquele que, sendo o objeto a própria fonte de luz, brilha a tal ponto de nos permitir ver os mínimos detalhes, aqueles escondidos de propósito, para que apenas os olhares atentos os alcançassem. Como quando estamos diante de um monitor: se houver muita luz, nada enxergamos e ainda podemos sentir graves desconfortos; se houver pouca luz, vemos mal e nem nos damos conta das ricas miudezas que ficamos sem conhecer. Brilho bom não toma luz emprestada para brilhar mais do que o brilho natural, afinal os únicos bons empréstimos são os de livros, quando você é o locador.

E ainda, brilho bom é aquele que não ilumina a si próprio, aquele que serve para apontar para algo. Quando o alvo é a própria fonte, algo vai muito mal – é preciso partir de um ponto para chegar a outro. Escapar da inércia, da estagnação. Esse brilho que aponta anuncia algo grande, maior que a própria fonte. E a verdade é que a meta certa de todas as luzes deveria ser só uma. Infelizmente muitas luzes distorcem, outras saturam, outras, por egoísmo, emitem pouca luz... Enfim, a maioria das luzes acaba sendo problemática em relação à meta. Obviamente, algumas vezes o problema não é a luz em si, mas os olhos de quem segue a luz – iluminação e os olhos do receptor precisam gerar um casamento perfeito, é o par – nem só um, nem só o outro. No fim das contas, o encontro das luzes também depende do projetista.

Parece, então, que encontrei a luz que emite o brilho certo. Como a Lua (até no nome), reconhece que o brilho não é seu próprio, mas dada por uma luz ainda maior. Como todos mereciam ser, aponta com carinho um caminho a seguir, caminho descoberto a cada dia sob a guia do Amor. Como eu precisava, me mostra que eu também sou luz, que também tenho essa centelha divina, que também aponto caminhos e que também ilumino escuridões. Como ninguém é capaz de merecer, é luz com brilho exato, sem excessos, sem ausências, sempre presente, sempre disposta, sempre fiel. Como luz que há de ser eterna, aponta para Deus e leva para junto dEle por meio do sorriso, por meio da dignidade e da liberdade de filha, de irmã, de amiga, de mulher errante, porque humana, e perfeita, porque divina.

É, pois com a luz que encerro, já que jamais serei de capaz de demonstrar e listar todos os atributos do Um Amor. Obrigado por ser única, concreta, livre, incompleta, regular, impecável, imprevisível, disponível, luminosa e todas as outras coisas que um dia, se Deus quiser, serei capaz de transformar em signos linguísticos. Obrigado por me fazer sermos nós. Obrigado por nos fazer sermos mais. Obrigado por ser O Amor.

VIII - Disponibilidade



"Tudo bem, seja o que for, seja por amor às causas perdidas"

As escolhas sempre nos guiam a algum lugar, às vezes bom, às vezes nem tanto assim (para ficarmos num eufemismo, já que a vida deveria ser mais eufêmica) e eu louvo Um Amor porque suas escolhas demonstram uma escolha: pela disponibilidade.

Estar disponível é para poucos porque a maioria não tem disposição para isso. Outros tantos acabam confundindo e achando que disponibilidade é estar pronto a qualquer hora para fazer qualquer coisa. Não é bem assim. Disponibilidade é estar disponível para o que, depois de ponderações diversas, de fato vale a pena. Muitos acabam nem pensando se aquilo para o qual delegam suas forças é ou não uma escolha sábia.

As causas perdidas a mim parecem ser aquelas que, de fato, devemos estar disponíveis. Inúmeras dessas causas existem por aí, e o número delas só aumenta. Tradição, responsabilidade, compromisso, disciplina, doação, tudo isso são rosas vermelhas num deserto de sal. A solidariedade tem se resumido a datas comemorativas, a ações visíveis e sob poderoso marketing.

Amar Um Amor é descobrir que porque as causas são perdidas é aí que elas são inspiradoras. Na verdade, o Um Amor é, humildemente e sem alarde, detentor de poder extraordinariamente formoso: o poder de transformar as causas perdidas em causas ganhas, mesmo que apenas pelo fato de terem sido defendidas.

Uma habilidade aqui e uma acolá, todas compõem um ser, mas o que seriam todos os dons, todos os desejos e os sonhos de um coração se não fosse a disponibilidade, se não fosse o estar aberto à maravilhosa missão de participar da brincadeira levemente séria e exageradamente feliz que é a vida, essa ciranda, essa brincadeira de roda. Somos duas das mãos na roda, somos duas das crianças da ciranda, somos duas hélices do moinho, somos duas cordas do violão... O que seríamos nós se não estivéssemos disponíveis, de prontidão para o amor?

Toda a gratidão do mundo a quem, pela disponibilidade, beija e abraça, chora e ri, briga e brinca, aprende e ensina, dá força e freia, ama e é amada. Só há uma que é assim, não há mais no mundo, é específica, determinada, definida, é o Um Amor.

VII - Imprevisibilidade




"Aprendi contigo a navegar em qualquer tempo, qualquer mar.
Aprendi contigo a desarmar as armadilhas do caminho..."

Ah a imprevisibilidade do Um Amor... É preciso colocá-la nesse rol de características desse antiobjeto de estudo que é o Um Amor.

Bem, para alguns, imprevisibilidade é o atributo que alguém ou algo possui de realizar ou ocasionar coisas inesperadas. E aqueles que assim o são realmente dão um pouco de trabalho. O ser humano precisa ser um pouco aberto, demonstrar que, além de falho, toma atitudes prováveis. Se caímos sempre na imprevisibilidade dos nossos movimentos, corremos o grande risco de subjugarmo-nos à nossa própria imprevisibilidade e tornarmo-nos desconhecidos de nós mesmos.

Claro que ser um livro aberto é problemático, uma vez que nem todos os que se dão a nos conhecer possuem a chave de leitura e, com isso, o livro acaba sendo deixado de lado, não por não ter nada a oferecer, mas porque o outro não estava preparado para lê-lo naquele momento. Mas acontece que existem pessoas para quem a chave da leitura foi dada e para essas pessoas a imprevisibilidade faz todo o sentido do mundo.

Não é aquela imprevisibilidade do segundo parágrafo, aquela é um extremo. Nem me refiro à total previsibilidade do início do terceiro, ela é o outro extremo. A virtude está no meio! O negócio, então, é saber ser um livro. Ser improvável como um, mesmo que o leitor, quando é esperto, antecipa acontecimentos e acerta aqui e ali. Mesmo assim, mesmo sabendo os próximos eventos que acontecerão no próximo capítulo, o leitor fica curioso, motivado, apaixonado a cada página e segue lendo, sem se prender a suas próprias expectativas, mas se deixando conduzir pelo que texto que, segundo o que vai descobrindo, vai sendo escrito à medida que vai passando a vista.

Imprevisibilidade é o dom de quem sabe viver sem se prender às expectativas, quer suas, quer dos outros. Talvez alguém levante a seguinte questão: então ser curioso é uma inconveniência... Bem, a curiosidade é um alimento. Move a vida! É ela que nos faz transformar até mesmo o mais presumível em algo inesperado – tudo para escapar da inércia: o mesmo beijo, o mesmo olhar, a mesma vida vira vida nova a cada linha lida.

E sabedoria tem aquele que, como o Um Amor, sempre tem vontade de viver cada dia essa imprevisibilidade plausível e nada assustadora, pelo contrário, cativante e úbere.

VI - Impecabilidade



"É impossível repetir o que só acontece uma vez,
é impossível reprimir o que acontece toda vez que alguém acorda..."

A sinceridade não é um atributo. É, muito mais, um órgão físico presente em alguma região dos miolos da cabeça. O esforço humano, então, não é de ser sincero, mas sim de não ser sincero sempre. E é aqui que entra a outra característica do Um Amor: a precisão.

Não sei se os demais seres humanos dão valor como eu (se é que eu sou mesmo um ser humano) a precisão – nomeei-a no título de “impecabilidade” e talvez não seja um sinônimo exatamente perfeito (na verdade, a perfeição dos sinônimos é um engano, tolice, ingenuidade, ilusão e outros tantos sinônimos), talvez daqui para o fim eu mostre a união dos campos semânticos. Dou muito valor e eu acho que não consigo explicar bem o porquê. Tentarei.

Qualquer pessoa já se deparou com uma situação em que os sentimentos todos se misturaram e, de repente, algum sobressai. Abole-se com isso a precisão. Todos os sentimentos se manifestam ao mesmo tempo e nenhum coopera para o bem daqueles que o tem – como o amor coopera sempre. É até natural que, devido à obscuridade de algum momento, não se saiba bem o que fazer com os sentimentos que se tem. Deixa-se um comandar os outros e perdem-se as estribeiras...

É por isso que fica raro encontrar a precisão. Há um ponto que se deve buscar (chamam atualmente de ponto de equilíbrio, revisitando a proposta aristotélica de que a virtude está no meio) e é uma busca sem fim porque, de fato, é difícil encontrar uma coisa tão espremida: força de um lado delicadeza do outro; falta versus excesso; overdose versus abstinência... A precisão é precisa, necessária (aqui o sinônimo ajuda!). E eis que aparece o porquê da impecabilidade no título: para ser impreciso há que ser impecável na hora do encontro, isto é, o momento em que é exigido de si a decisão entre uma reação ou aquela diametralmente oposta.

À hora do “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come” quase ninguém sobrevive. É a sinceridade, descontrolada, a responsável por essa não sobrevivência. Na hora H, no dia D, muita gente acaba sendo sincera a ponto de, ou explodir e destruir tudo ao redor, ou correr e escapar da luta, fugir com desonra. Costumo ser esses últimos. Mas o Um Amor tem doutorado em imprevisibilidade (essa é outra característica ainda a ser apresentada) e sempre mostra a precisão. Imprevisível porque ninguém espera que um ser humano, em vez de puxar o gatilho ou de correr da briga, mostre o que de fato precisava ser feito. O Um Amor é impecavelmente preciso. E isso, mais que raro, é sobrenatural.

No meio da força e da delicadeza, do exagero e da escassez, da solidez e da flacidez, da razão e da emoção (substantivos eternamente briguentos) deve morar algo, esse algo, me mostrou o Um Amor que é a autenticidade e o amor pela objetividade na decisão. Precisão. Algum dia serei impecável em minha descrição e hei de demonstrar exatidão no relato dos fatos para comprovar a teoria. Mas não estou fazendo experimento, mas formulando hipóteses. E minha hipótese principal nesse ponto é que o Um Amor é Um Amor porque é impecavelmente precisa, embora tenha como qualquer ser humano tantos sentimentos em sua vida.

Que o mundo encontre a precisão como eu precisamente encontrei. E, sabe, eu não precisaria ser preciso com mais nada... já fui preciso ao me eleger amor do Um Amor.

V - Regularidade



"Encontrei, depois de tanto tempo,
em vidas passadas, em noites passadas em branco..."

Toda teoria deve partir de regularidades e essa não é diferente. Há uma periodicidade de sensações diversas, embora, às vezes certas sensações apareçam fora de ordem (responsabilizo o caos constante naquilo que é ordinário à batida das asas da borboleta... graças a ela acontecem os furacões no Japão!). É como escreveu o sábio “há um tempo certo para tudo debaixo do sol”.

Há o tempo de não ter saco para nada – inacreditável como esses dias são inúmeros. Já foram muitos os momentos em que, mesmo juntos, parece que a única coisa que apraz é ficar sentado olhando para o nada, tentando encontrar algo que satisfaça a vontade de nada fazer. Algum dia ainda havemos de perceber que é os dias de moleza, quando não produzimos nada, que mais nos unem. Talvez sejam eles os responsáveis pela prevenção de sobrecarga no sistema!

Há o tempo de engordar – me assusta esse tempo. Dizem que um homem sem barriga é um homem sem história. Acabo estendendo esse jargão à mulher, por isso faço o Um Amor comer tanto chocolate. Bem, questões médicas à parte, não me parece de todo equivocado supor que a vida foi feita mais para se comer do que para se viver. Não comer a vida, mas comer as coisas gostosas que por causa dela fazemos. Prova de amor maior não há do que dividir o último pequeno pedaço de chocolate (que me perdoem os olhos rijos por essa referência católica) e já demonstramos tanto esse amor. Deixando os exageros de lado, acho que engordar junto faz parte de um processo constante de saboreio das coisas deste mundo sem fim.

Há o tempo de brigar – tem que ter, né?! Antes eu tive tanto orgulho de passarmos inúmeros meses sem saber o que era briga, na verdade, ambos tivemos esse orgulho. Isso porque mal sabíamos o quanto ainda precisávamos crescer. Normal. Mas somos incompletos, não podemos ter certeza do que nos faz bem, devemos apenas averiguar se o que sentimos é mesmo bom e se não pode melhorar. Talvez as brigas sejam como as pancadas que o escultor dá na pedra para que ela fique da exata forma pretendida, ou mesmo como um desfibrilador num coração inerte... É isso! Inércia! Há sempre que se fugir dela! É sempre preciso algum para espantar a primeira lei do sir. Isaac. A rotina faz parecer que é natural tudo amornar. E é verdade, quentura demais é prejudicial. Mas esfriar jamais. E só se escapa da inércia com sutilezas, sutilezas tais que não são passíveis de receituário, é instintivo.

Há tempo de voltar – relembrar pensamentos, reviver fatos. Esse período, que acontece sempre que bate a nostalgia, nos dá gás renovado para, mesmo com a cabeça lá nas nuvens, manter os pés no chão, comprometidos muito mais do que com o futuro, mas também com o passado. Cometem-se muitas injustiças nesse planeta arredondado porque o passado é julgado como algo que já passou e que, por isso mesmo, pode ser modificado e contado do jeito que se quer. Engano monumental. O passado é a margem e a calha do rio: quando ambos sofrem maus tratos, o rio é assoreado. Li que o assoreamento não mata o rio, mas o faz transbordar e causar estragos ao redor. Mesmo que morra, o rio acaba pirando!

Talvez haja até o tempo de dar um tempo... Mas se ele realmente houver, que seja um tempo em que se esteja junto, para que ele passe sem vê-lo passar.

Há tempo para discordar, há tempo para defender, há tempo para badernar e há tempo para se viciar pelas coisas do outro – o certo é que só há uma coisa em comum em qualquer tempo que houver: o fato de ser O Tempo do Um Amor.

É por isso que nada pode ser menos que lindo quando é dia cinco. Dia que volta o ciclo, quando tudo está no seu lugar.

O Um Amor é regular e não inerte. Milagre possível para um risolhar de quem é o Um Amor.

IV - Incompletude




"Só você sabe quem eu sou,
só você sabe como é..."

Provavelmente consideram característica problemática aqueles mortais que não se reconhecem como tal o fato de que o ser humano é inerentemente incompleto e passa uma vida toda, às vezes, para descobrir-se assim. E é incrível como a raridade do encontro com alguém que tem essa consciência é capaz de deixar qualquer um sem saber o que fazer ou falar.

Este que escreve não é qualquer um, embora não seja alguém totalmente preparado (ninguém o é) para as emoções que a vida desvela. Mesmo assim, não escapei do encanto e da sensação extraordinária que sinto sempre que participo de uma acareação entre a arrogância da humanidade e com a incompletude do Um Amor. São sutis essas ocorrências, mas, por serem sutis, são indeléveis: não há como esquecer eventos em que uma mulher, de pouca idade, tem consciência de que muito lhe falta para chegar a um ponto que ainda não será o final.

Claro que não poderia ser o pensamento de todos os homens – muito menos das mulheres. Pessoas assim são escolhidas a dedo pelo Projetista. Todo ser humano nasce incompleto... e assim também morre. Quando criança, vamos descobrindo universos de coisas, muitas dessas coisas estavam dentro do próprio ser, mas precisava de um gatilho para que desabrochassem. E, já quando criança, uma dessas coisas que se dão a aparecer é a arrogância. Qualquer um é capaz de lembrar alguma situação em que se sentiu completo, capaz de tudo, mesmo criança. A diferença é que, quando criança, ao cairmos, aprendemos o que fazer para não cair mais. A idade chega, trazendo junto a ignorância da certeza de que existe um ponto de chegada. Sem se dar conta, vamos nos dando conta que as coisas das quais vamos nos apropriando vão se somando até preencher todos os espaços vazios. Pura arrogância!

Somos incompletos e sempre seremos. Nunca temos consciência disso. E, por incrível que pareça, há sempre uma razão para acreditarmos no divino. É divino que alguém tenha consciência da própria pequenez e de que a vida é uma eterna busca, mesmo quando pensamos que chegamos ao fim. Se não fosse sempre busca, um dia pararíamos e não teríamos para onde ir.

O Um Amor me mostrou que é possível saber já nessa vida que ela é incompleta e que a completude nos dizima aos poucos. Enquanto todos os demais se acham paladinos da vida, ela sabe muito bem que ela é só um ser pequenino neste mundo, quase uma hobbit (embora seja ela quem imagino quando penso em Lúthien, personagem mais bela do universo criado pelo meu filólogo favorito). Impossível não se apaixonar por tamanha sabedoria.

É a pseudocompletude que engendra a sensação de completo vazio. Ao mesmo tempo, é a grandeza de admitir a própria pequenez que traz uma sensação de estar-se cheio de tantas coisas: paz, alegria, sonhos... Combustíveis da eterna busca!

É preciso agradecer por isso. É raro. Único à minha vista. Por isso é Um Amor. 

III - Liberdade



"Meu coração é um porta-aviões 
perdido no mar esperando alguém pousar"

A tendência que o mundo tem é de acreditar em tudo ou de acreditar em nada. Ingenuidade e ceticismo são dois lados de uma moeda negra pela qual não podemos brigar.

Advogo que não podemos ser certos de qualquer coisa, afinal os dias recomeçam todo dia. Ingenuidade e fé cega caminham de mãos dadas. Ceticismo e dureza de coração morrem de pés juntos. Sobre o amor doentios ambos.

A ingenuidade no amor leva ao nada da mesma forma que o nada leva a lugar algum. Quando se acredita em tudo e a tudo dá-se o nome de amor já não é mais um risco, mas é factual a direção infeliz que se há tomado (pedi essa construção bem aqui do espanhol, não sei o que acho dela no português!). Nem todo latido de cães na alta madrugada é contra um perigo, pode ser apenas um teste, ou solidariedade – já percebi que os cachorros são solidários com seus demais espécimes, latem com a mesma força quando um puxa o coro. Todo cuidado é pouco para não se crer no incrível.

O ceticismo no amor é igualmente doloroso e, como a primeira, leva para o mesmo nada do outro, demorando o mesmo tanto de tempo para que esse nada se revele. Embora seja compreensível que alguns corações se fechem a fim de manter resguardo após pomposa treva, é questão de tempo perceber que uma porta sempre trancada guarda alguma coisa valiosa! Todo cuidado é pouco para se crer no incrível.

Entre ingenuidade e ceticismo está a liberdade. E foi essa liberdade que gerou o Um Amor. Sagacidade é a velocidade que se tem de compreender o quanto algo é necessário na vida e humildade é reconhecer a hora certa de descosturar a roupa toda para tecê-la do início com mais atenção, mesmo que seja preciso mudar a corda linha. E o Um Amor foi sagaz e humilde: deu fim ao que não começou e começou o que não pressupõe fim. Manifestar a liberdade é algo que requer tempo para que se compreenda que às vezes o que estivemos a chorar pode continuar nos fazendo chorar, mas de rir, sem deboche, graças à certeza de que se pôde ir além!

Amor mesmo é quase dor, mas não maltrata. Amor que se preza chora, mas não mata o riso. Amor é sempre verdadeiro, nunca é pela metade. Sentiu dor, chorou, duvidou, mas nunca desistiu porque foi livre para viver, exonerar velhos limites e compreender os novos e, por fim, tornar-se o Um Amor. E foi livre para libertar o Um Eu.

II - Concretude



"A gente vive assim: sempre acabando o que não tem fim..."

Sempre me intrigou ao extremo o fato de que “nuvem” é um substantivo concreto. Ele é tão leve. Tanto o significante quanto o referente. Quase não fazemos esforço algum para pronunciar essa palavra. E o que dizer das nuvens lá do céu. Na verdade, a meteorologia me refutaria, sem muito esforço, dizendo que as nuvens são sim muito pesadas, logo eu devolveria fazendo a a seguinte pergunta: o que pesa mais: um quilograma de nuvem ou um quilograma de cimento? Para além da palavra “nuvem” em si, me intriga muito mais a subclassificação dos substantivos em concretos e abstratos. Nessa história, amor virou substantivo abstrato. Como assim, se amor é uma palavra tão pesada, forte, indestrutível e palpável? Não entendo vocês, normatizadores!

O Um Amor, diferente do amor que é substantivo abstrato, é substantivo próprio e talvez seja por causa das propriedades desse nome próprio que eu me confunda tanto com o que venha ou não a ser o amor abstrato.

Parece-me que abstrato é o amor sem peso, o amor que não tem gravidade, que vive nas nuvens. Opa, as nuvens são concreto! Meu ponto é que amor sem agrura sofre de sobrecarga iluso-aparenciológica. Explico: não requer tanta busca o vislumbre de abstrações tais que nos fazem pensar que o nosso conceito de amor é equivocado. Pessoas cuja aparente felicidade é a mão esmagadora de um estúpido alardeio.

Que me faz julgar o amor dos outros? Bem, não julgo o amor de ninguém, julgo a abstração desses amores. Amor não é um riso sem fim nem uma alegria indescritível. Amor não é nada que deixe a boca sem dizer palavra e as pernas bambas. Isso pode ser fome, êxtase ou tantos outros sintomas. Amor é concreto. Duro. Forte. Inconcusso – pra usar um adjetivo que eu ainda não usei.

Para ser inabalável há que ser pesado e de ter o couro grosso, e para chegar aí é preciso muito choro e ranger de dentes. São 7 os infernos de Dante e depois deles a vitória. Alguém, que eu não vou lembrar quem, disse que se começamos a atravessar um inferno, não podemos parar até chegar do outro lado. Calma, calma, calma! Não estou dizendo que o amor é o inferno, estou dizendo que amor é mais concreto que qualquer sofrimento.

Um nó feito na garganta por uma tristeza é algo concreto. Os olhos inchados e cansados pelo choro são concretos. A dor no peito por uma queda monumental é concreta! E amor é ainda mais concreto que tudo isso.

O amor demanda rigidez, afinal é uma construção, necessita de alicerce! Alicerce abstrato não sustenta amor concreto!

Já elenquei meu objeto de estudo e agora instancio o meu método: meu método é o da observação da concretude do Um Amor para bem estudá-lo. Para o plano das ideias devem ficar passado e futuro, por isso essa observação é sincrônica. E hipóteses, pelo seu teor abstrato, também são dispensáveis. E dispensáveis também hão de ser as incontáveis coisas que desservem, que não somam, pois não pesam, que não engrandecem, pois não sustentam. Amor abstrato é coisa da esquerda! Nem o ar é impalpável, imagine o amor que fá-lo movimentar-se...

I - Unicidade



"Sempre que eu preciso me desconectar 
todos os caminhos levam ao mesmo lugar..."

Essa história de “o Um Amor” é claramente uma referência ao anel destruído por Frodo (ou seria pelo Sméagol) na Montanha da Perdição, terra inóspita a sudeste do Condado. Ok, parei! O caso é que é interessante esse uso definido do artigo indefinido. No caso do amor, então, faz todo o sentido do mundo.

Bem, no inglês, língua em que meu filólogo favorito escreveu a obra do milênio, diz-se “the One Ring”. Essa língua, diferentemente do português, diferencia o numeral do artigo indefinido. Ambos têm a mesma forma na última flor do lácio, “um”, enquanto no inglês há o “one” para o primeiro e o “a/an” para o segundo. Então, aquilo que serve para dar ideia de unicidade no inglês acaba indeterminando e indefinindo em português. Evidentemente, essa operação de indeterminação não se verifica, uma vez que sabemos bem a qual anel estamos nos referindo quando dizemos “o Um Anel” (as iniciais maiúsculas dão o último golpe na possível ambiguidade). Mas vale a pena divagar um pouco sobre a (in)determinação do amor.

O amor de qualquer um é indefinido até que se defina, indeterminado até que se determine, não específico até que se especifique. Estou usando os três termos como sinônimos para algo que eu tenho medo de que minha argumentação faça confundir com destino. Não quero entrar na pergunta-sem-resposta e resposta-sem-pergunta se há destino e se amores são predestinados, contudo não é pouca audácia dizer que muito mais do que o amor com o qual sonhei é tão menos extraordinário o amor com o qual nunca sonhei.

É muito fácil ser surpreendido: a imaginação antecipa coisas e essas antecipações são facilmente superadas ou sucumbidas. Às vezes o que acontece é mais do que se imagina, às vezes é menos. Nunca é a mesma coisa. Embora a mente seja a placa de vídeo mais perfeita que existe, a materialidade dos fatos observados a olhos nus e sentidas a corpos unidos é um ponto decisivo para a construção final da sensação. E parece que o tempo é o mestre de obras! O Projetista não cabe nessa teoria, mas é a Ele que precisamos saber agradecer.

Não resta, ou ao menos não deveria restar, dúvida de que há um certo embaralhamento no começo das coisas até que o amor faça algum sentido. Na verdade, nunca o compreendemos 100%, afinal somos humanos e talvez uma das coisas que nos defina como tal seja o fato de, mesmo não compreendendo, continuar tentando compreender o que é o amor. Se fica alguma dúvida sobre a hora certa de amar e de chamar algo de amor, é porque estão sobrando certezas numa terra onde há descoberta todos os dias. Para amar há que se indeterminar primeiro, aprender a dizer “não sei’, conformar-se que o que se sabe é pouco, indefinido, fragmentado. O amor é cola que há, um dia, de aglutinar todos esses fragmentos.

É, então, que parece inteligível uma das falas de Gandalf a Frodo: “há outras forças agindo neste mundo, além da vontade do mal. Bilbo estava destinado a encontrar o anel e você também estava designado a possui-lo. E esse é um pensamento encorajador”. Há alguma coisa que faz duas entidades serem unidas, assim o que é aparentemente indeterminado aos poucos se revela algo determinado desde sempre. O que antes nunca existiu passa a existir desde e para sempre. Não faz muito sentido, a princípio, mas toma contornos críveis quando pensamos que não pensamos em antes do começo e depois do fim do amor. Delegamos toda a nossa espiritualidade para a tarefa de destituir a máxima de que todo começo tem seu fim, considerando que, na verdade, não existe começo e que o que há é o que sempre houve.

Mais uma contradição se interpõe aqui e, com ela, eu termino essa parte: se é indeterminado para determinar-se, sendo que sempre foi determinado, como posso propor uma Teoria Geral do Um Amor? Bem, aqui é preciso ler “o Um Amor” da mesma forma que “o Um Anel”: é um único, um apenas. E é geral porque as teorias gerais devem explicar coisas universais... E esse Um Amor é o Universo que me contém. Exatamente por isso é impossível dizer que ele é meu precioso, pois eu é que pertenço a ela. A Teoria é Geral do Um Amor, meu antiobjeto de estudo aqui, então, se chama Amanda: gerúndio do Amor.

Teoria Geral do Um Amor



"A medida de amar é amar sem medir..."

Quanto mais a contagem dos meus dias ganha dígitos e quanto mais eu penso que meus cabelos estão ficando brancos (embora isso não seja apenas pensamento), menos isso faz sentido pra mim. Acontece que tem algo estranho nessa frase atribuída ao santo que mais presto devoção: se meço o amor, então não é amor, correto? Então, se amo com todas as minhas forças, significa que não estou amando?

Questões sintático-semânticas à parte, o fato é que sempre me intrigou a singularidade dessa frase tão suavemente caótica (desculpa o paradoxal costume de apelar a paradoxos de sempre [desculpa a mania sempre néscia de apelar a parêntesis]), pois de modo extremamente objetivo ela apresenta toda a problemática da raça humana. E o quanto esse lance de raça humana é um enigma deve entrar também nessa conta de intrigas causadas por sintagmas e/ou sentenças.

Amar com todas as forças é dizer que existe algo cuja força não é a mesma. Há uma metragem aqui. Se houvesse um amôrmetro, saberíamos a diferença entre um amor e outro. Sempre me perseguiu uma ideia de que, quando algo é amor, ele se torna imensurável, daí meu pensamento de que amar é mais difícil do que parece.

No tocante à raça humana, intriga-me a impossibilidade de medir também o nível de subjetividade do que é ser humano. Já pensei, repensei e des(ou dis-)pensei e ainda não concluí o que é que venha a ser o traço definidor de humano. O campo semântico deveria ser menos vasto: há animais que são mais humanos que pessoas e pessoas mais desumanas que animais. Então o que têm em comum todos os humanos? Um professor meu de filosofia dizia que era o “húmus” – ele argumentava que viemos da lama e para a lama voltaremos. Questões latinas também à parte, lama também é incontável.

Há uma semelhança, portanto, nas coisas do mundo e, ao que parece, é a impossibilidade de contar que iguala todas essas coisas. Mas venha quem vier, não sei se troco esse pensamento: amor não é desse mundo. Claro, o amor está neste mundo, mas ele não é daqui. Veio de presente de um infinito do qual somos só amadores.

Deixe-me, então, ao longo de alguns escritos tentar mostrar o universo de caracteres de onde eu acho que nasceu o amor... Ele tem nome, idade, peso e todas as outras exigências do mundo físico. Ele é ela. E ela é o céu. Amanda, 24 no desde as 0h, 55 kg (talvez mais daqui pro fim do dia)...

Na tentativa de não medir o incontável, vou apenas contar o que já consigo associar a significantes... Bem-vinda à teoria geral do Um Amor!

28 de maio de 2015

Cidade Em Chamas


"Bring your daughter, bring your daughter
to the slaughter... let her go, let her go, 
let her go!"

De ontem pra hoje as rodas de conversa têm exigido dos interlocutores um mínimo de palavra sobre o acontecimento chocante da vez: cinco rapazes violentaram (espero ter feito a escolha lexical mais objetiva, para não cair na listagem de ações por eles feitas a fim de dar uma ideia do que houve) quatro meninas na cidade de Castelo do Piauí, estado do Piauí.

Das moças, futuras mulheres, não interessa a idade: a dor é a mesma... incalculável! Dos responsáveis pelo crime (resguardar-me-ei doravante ao direito de classificá-los ou não como humanos), só um tem mais do que 18 anos, todos os outros são menores de idade. Importa suas idades na medida em que podemos vislumbrar o que há de acontecer.

O que se sucederá é o mais do mesmo: fogueira aos menores!; até quando isso vai acontecer?!; país sem lei!; seria melhor deixar o povo, revoltado, fazer a própria justiça!; vão ficar só algum tempo detidos numa tentativa sempre frustrada de ressocialização e logo estarão livres para fazer tudo outra vez!; pena de morte!; prisão perpétua!...

Eu sei que eles têm razão... mas a razão é só o que eles têm.

Já defendi em outra ocasião a não redução da maioridade penal. Não mudei de ideia (ainda). E estou tão revoltado quanto qualquer outro com essa situação – e todos nós não fazemos ideia da dor pela qual passam as famílias das garotas... muito menos a dor delas próprias.

Outros ainda serão aqueles que esbravejarão: mas o que essas meninas queriam naquele lugar tão ermo sozinhas?!; quem procura acha!; se tivessem em casa estudando, não teria acontecido nada disso!... (não ouso continuar).

Eu sei que eles têm razão... mas a razão é só o que eles têm.

As palavras faltam, as revoltas sobram, os motivos valem para ambos os lados, e sempre tem gente que se coloca de um lado ou outro. Sempre aparece um advogado que, na busca por status e reconhecimento no meio jurídico – acreditem, ser responsável por uma vitória no tribunal diante de tantos fatos contra os criminosos é merecedor de aplausos para muitos, respalda a habilidade de tal magistrado -, há de defender os autores do incaracterizável crime. Como eu disse, sempre aparece UM advogado. Não são todos.

E, de modo geral, no país em que político é celebridade e artista é marginal, continuamos sem nos questionar sobre fatos que realmente importam. Continuamos preferindo discutir a vulgarização da imagem feminina e a redução da maioridade penal, como se fossem só esses os problemas. Continuamos sendo excelentes analistas, com respostas certeiras a perguntas de sim ou de não, dubitáveis, induzíveis. Continuamos incertos e pávidos sem saber se é justo trazer ao mundo crianças para viverem essa guerra que nunca termina. Viver tem sido sacrifício, mesmo tendo sido tantos os que se sacrificaram por nós.

Questiono-me sobre os sonhos das garotas, sobre o que as divertia, sobre o que as emocionava, sobre o que as fazia felizes... Não importa o que eram, jamais serão os mesmos!

Questiono-me sobre os autores da monstruosidade... será se tinham sonhos?!

Duro nó na garganta que não afrouxa.

Que as chamas venham, pois elas devem ser mais belas que isso aqui.

18 de maio de 2015

Perdendo A Pé


"Por amor às causas perdidas..."

Por esses dias algumas notícias, no mínimo, abismais: na esteira dos tantos incontestavelmente incontáveis e praticamente infinitos casos de violência, três conhecidos meus foram presos, apontados como os principais envolvidos em ocorrências diferentes de sujeira, corrupção, tristes revelações da natureza humana.

O primeiro deles, conhecido dos tempos de escola, foi preso em flagrante com um comparsa, acusado de roubo de carro. Ao que tudo indica, fazia parte de uma quadrilha – como já de praxe no nosso Brasil, um ou dois presos não são nem um punhado de gelo do iceberg – especializada (quiçá com mestrado e doutorado) no mau-ofício de roubo de carro. Perdi um pouco da minha pouca fé ao ver a foto nos ciberjornais.

O segundo, conhecido de infância do futebol na quadra da creche, foi preso com mais dois companheiros após um arrastão por eles promovido numa lanchonete de um bairro nobre daqui. Irreconhecível a ponto de engendrar em mim a dúvida de que realmente fosse ele, teve sua foto rapidamente compartilhada entre os contatos... Perdi mais um pouco da minha pouca fé ao ver a foto nas ciber-rodas de amigos.

O terceiro e último, conhecido um tanto quanto mais distante (mas não menos conhecido), foi preso acusado de participar de um esquema voluptuoso de violação de direitos autorais. Lembrava aqui e acolá das visitas que ele fazia a minha tia, tinha um sorriso cativante, caridoso, em nada questionável. Mas o que é sorriso quando às vezes os mais tristes são os que mais riem – como naquela história do palhaço que apontava a todos o sentido da vida por meio da alegria, mas não conseguia encontrar o sentido para sua própria? Perdi ainda mais um pouco da minha pouca fé ao ver a história nas ciberesquinas.

Já até escrevi neste mesmo singular solitário espaço que eu continuo acreditando naquele que não foge à luta. Não perdi toda a minha pouca fé. Continuo firme na certeza que, mesmo em números raros e escassos, ainda existem os apaixonados pela Dulcinea del Tomboso e que continuam firmes na fé de que outros semelhantes a eles existem. Hoje temos todos os porquês do mundo para desistir de nossa fé na humanidade, mas, assim como pode ser que seja (não sei...) da natureza humana a corrupção, é também de nossa espécie a teimosia e a obstinação, a insistência e a garra, não por um objetivo impalpável e invisível, mas pelo sorriso... aquele que é tudo, aquele que pode existir em todos, verdadeiro, profundo, feliz.

15 de abril de 2015

Qual o melhor: Pepsi ou Coca?


Eu sei lá!!! Eu até gosto um pouquinho mais de Pepsi, talvez por ser menos comum pelas bandas de cá. Mas quem é melhor? Na verdade, esse texto não é uma reflexão acerca do líquido mais condenado – mais até do que as bebidas alcoólicas – da atualidade (como se um suco de maracujá que você toma de vez em quando não tivesse açúcar e tantos outros invisíveis assassinos tóxicos). Minha intenção é pensar um pouco sobre a quantidade assustadora de especialistas que existe hoje em dia.

Tem muita gente por aí, caro amigo, que pensa saber de tudo um pouco. Se o tópico de uma discussão é política, então ei-lo ali a apresentar hipóteses; se o assunto é futebol, lá está ele; se o assunto é culinária, acredite, ouvimo-lo aqui também; se o assunto é língua portuguesa, matemática, ENEM, MEC, Dilma, Direita-Esquerda, sinais de trânsito, o trânsito, o tráfego, o tráfico, a influência da mídia, a mídia... o espaço sideral... os oniscientes dissertam. Isso é de entristecer um pouco. O Mão Santa (não vou entrar no mérito se ele é também um desses nada-sabem-acerca-de-tudo), um ex-governador daqui, lembrava sempre em seus discursos que a ignorância é audaciosa. E, de fato, o é. O caso é que cada dia mais é maior o número de pessoas que esquecem o velho ditado “cada macaco no seu galho” (volta,É o Tchan!!!). São inúmeras as pessoas que pouco leem e muito escrevem. Muito falam e pouco ouvem. Muitos falam e ninguém ouve.

O outro problema que encaro com tristeza é o apartidarismo de discursos que pregam imparcialidade. O discurso científico e o discurso jornalístico entristecem, apelam para nossa ignorância. Não são poucas as pesquisas e reportagens subsidiárias de uma ideia rentável a alguém. Uma pena. Nem ciência nem jornalismo são imparciais. Ambas são feitas pelos seres humanos. Veja a arte! Ela é livre porque não usa essa fantasia/máscara de imparcialidade. O ser humano não pode ser imparcial, isso só se aplica aos robôs (por enquanto).

É preciso saber dizer “não sei” ou, ao menos, “ainda não sei”. Sabemos mais quando sabemos que existem algumas coisas sobre as quais sabemos do que quando pensamos que saber muito é quando falamos de tudo quanto se fala. A sabedoria é luminosa. 

31 de março de 2015

Ignorância Digna / Dignidade Ignorante

Foto: Osman Sağırl

A criança síria te comove e da nossa tu corres

Impelido por um amigo, de posição viva e clara, escrevo algumas palavras, tímidas, porém sinceras, acerca da discussão de muito tempo, mas que é agora o assunto do momento: a redução da maioridade penal.

Não sou especialista – nem tenho know-how para ser –, nem sou um profissional ainda, embora já dê meus primeiros passos além do diletantismo naquilo para o qual me preparo para vir a ser. Mesmo assim, penso que cabe uma opinião a mais (que, na verdade, pode se parecer a tantas outras por aí) nesse vale de discursos, ofensas e lágrimas.

“Ninguém pode ficar no meio do tiroteio”, e o tiroteio está voraz demais. Não o tiroteio das ruas e favelas, mas o tiroteio de opiniões que se apresentam. Vou tentar ser como um tiro apenas pela rapidez, pois sei que barulhento não serei.

Contra ou a favor? Mas contra ou a favor de que? E por quê mesmo? Sou contra. Contra a redução da maioridade penal. E não é porque sou Du contra. Não concebo a ideia de reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos por, pelo menos, dois motivos básicos: i) não soluciona nem ameniza o problema; e ii) causaria um inchaço ainda mais desastroso do sistema prisional.

A leitura do não especialista que sou é a de que diminuir a maioridade para 16 seria diminuir também a idade dos criminosos. Hoje em dia já é comum ver crianças de 14 anos praticando crimes hediondos (numa rápida pesquisa na grande rede encontrei várias notícias que sustentam meu ponto. Escolhi apenas esta por ser a mais recente: http://g1.globo.com/bahia/noticia/2015/03/menino-de-14-anos-mata-adolescente-de-17-por-causa-de-divida-de-r-30.html). Com a punição aos 16, crimes hediondos cometidos por crianças de idade inferior a 14 (como já é o caso deste de 11: http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/policia/online/suposto-autor-de-crimes-menino-de-11-anos-e-assassinado-em-ico-1.1153562), que hoje são de nos assustar, serão vistos com maior frequência, serão comuns.

O segundo motivo é algo lógico. Ora, se adolescentes de 16 e 17 anos passarão a responder como adultos, para onde eles irão a fim de pagar suas penas? Acontece que a superlotação das carceragens já é uma realidade há tempos. Alguém ainda se lembra das super-rebeliões em Pernambuco neste ano (http://g1.globo.com/pernambuco/noticia/2015/01/em-2-dias-de-rebelioes-em-presidios-de-pe-numero-de-feridos-chega-72.html) ou das notícias rotineiras de superlotação na Central de Flagrantes de Teresina (http://cidadeverde.com/central-contabiliza-75-presos-sejus-ira-transferir-30-nesta-terca-feira-189251). Isso para ficar em dois exemplos apenas! Então, para onde vão os, hoje, menores de 16 e 17 anos que serão contemplados, caso vá em frente a proposta de emenda à constituição (mais remendada do mundo)?

Muitos são os outros possíveis argumentos contra a proposta, mas só gostaria de deixar esses dois que apresentei aqui, sem esquecer uma coisa que tem me parecido nessa briga toda: estamos apenas transferindo responsabilidades! A verdade é que estamos (e o ‘nós’ desinencial quer dizer nós cidadãos, pais, filhos, irmãos, cristãos, não cristãos, políticos, eleitores, professores, alunos...) perdendo a guerra contra a criminalidade graças à cultura do egoísmo – se os meus estão bem, tudo está bem – e graças à cultura do ódio – que se danem esses meninos que não querem prestar!

Apresentei dois argumentos, apresento duas possíveis soluções: i) os projetos de educação, esporte e cultura dos governos e da iniciativa privada precisam chegar às periferias – hoje eles são tão tímidos, tão segregantes, que o público-alvo que mais precisa não é contemplado com o pouco de projeto que ainda existe (ou subsiste); e ii) o aparelhamento do judiciário para que processos tramitem e tantos criminosos – traficantes e corruptos gigantes – sejam responsabilizados por seus crimes, afinal pôr uma arma na mão de uma criança é crime tanto quanto desviar uma verba que se transformaria em um campinho e uma bola de futebol ou em um violão ou em um livro de histórias em quadrinhos para armar as crianças de dignidade.

Não basta transferir a culpa! A culpa não é deles! Todo erro merece punição, mas ser punido sem a chance de aprender o que é e o que não é crime não tem lógica! Estamos perdendo a guerra porque não percebemos que cada criança que queremos mandar para cadeia poderia ser um atleta, artista, cidadão gigante do seu tempo. Não basta transferir a culpa e cidadania não se exerce só na urna! O Brasil, hoje, é o país do futuro que passou. Não destruamos os sonhos que construirão o que ainda poderemos ser.

7 de março de 2015

Recomeçando do Começo


“Por onde devo começar, majestade?” perguntou o Coelho Branco ao Rei e o Rei, (em bom piauiês:) “nem besta nem nada”,  ordenou que o Coelho começasse pelo começo e que continuasse até chegar ao fim e depois parasse. Ignorância?! Talvez...

Se, no lugar do Coelho Branco, eu tivesse a chance de ser o bedel do Rei do País das Maravilhas, ficaria em dúvida frente à feitura ou não da pergunta que me veio à mente: por onde devo recomeçar?!

Por sorte ou azar, não estou no País das Maravilhas e eu, tampouco, sou um coelho de olhos rosados – na verdade, a única coisa rosada que tenho é a casa. De qualquer modo, eu já respondi essa pergunta antes mesmo de perguntá-la. Eis, pois minha resposta: http://rivanildosilva.blogspot.com.br/2015/03/duas.html.

Com efeito, comecei pelo recomeço – ou seria recomecei pelo começo? Muito bem, parece que estou mesmo no País das Maravilhas, pelo menos no País das Maravilhas da Linguagem, então, se minha licença poética me permite, acho que dá no mesmo!

Comecei pelo recomeço – ou recomecei pelo começo –, isto é, comecei escrevendo a quem me inspirou a criação desse blog, a quem me inspirou a criação de algumas canções, a quem me inspira a criação de uma literatura, a quem me inspira uma vida de poesia, muito mais do que uma poesia de vida. Obrigado, amor!

Enfim, espero não esquecer que o futuro a Deus pertence e que cada letra que escrevo são as pistas que vou deixando a fim de não perder-me no caminho (opa! Essa é outra história, não é a do País das Maravilhas!!!). Então, antes que eu me perca, vou dando meu “até logo”, para voltar o mais rápido impossível!

3 de março de 2015

Duas

Saímos da mesma fonte,
da mesma junção de ingredientes,
é claro que tu tens um matiz mais abrangente,
sou menos colorido,
é por ti que me divirto...

Somos fruto do mesmo sopro,
firme, forte, infinito,
que nos chama ao retorno de onde vimos,
mas que, na passagem,
deu ao outro nossa mão.

Somos voantes pelo mesmo vento,
com uma diferença de quando nascemos:
tínhamos, cada um, duas asas...
agora nós...
nós temos quatro!